sexta-feira, 23 de julho de 2010

TRIBUNA DE SANTOS - O RASCUNHO DE UM RIO


MATÉRIA JORNAL TRIBUNA DE SANTOS - GALERIA - CRÔNICA DE MADÔ MARTINS - DOMINGO 27 DE JULHO 2010.

O sempre novo Sesc
                                                                     Madô Martins         E-mail: madomartins@yahoo.com.br


Sei que escrevo com frequência sobre o Sesc e o leitor pode até pensar que sou algum tipo de garota-propaganda ou assessora de imprensa disfarçada, mas o fato é que coleciono novas surpresas agradáveis toda vez que passo por lá, relativas a eventos ou procedimentos que gostaria de ver reproduzidos por toda a Cidade, com iguais qualidade e oferta democrática.
     Cito alguns exemplos: sonho com o dia em que voltemos a contar com publicações locais semelhantes à Revista E, nós que já tivemos a Artéria, da Secretaria de Cultura. Imagine que, na deste mês, o Sesc traz à luz a oportunidade de reflexão sobre um tema inusitado em edições distribuídas gratuitamente: o papel da indústria cultural dentro da produção literária, em artigos exclusivos assinados pelo ensaísta e crítico literário Fabio Lucas e o professor da Unicamp, Fabio Durão. Em seis páginas, ambos passeiam pela genialidade de Marcuse, Rousseau, Mill, Gramsci, instigando o leitor a perceber que “a arte perdeu a aura sublime, a partir da atual cultura fast- food”, e “a indústria cultural tornou-se sequela da cultura de massa, canonizando textos sem estilo, repletos de simplicidade palmar, neutralidade e redundância, incapaz de estimular a revolução dos conteúdos”. Discussão acadêmica e pouco acessível a leitores desavisados? Pensar não doi. Mas, mesmo que tal assunto assuste alguns, há reportagens e artigos para todos os gostos, desde o uso crescente da bicicleta nas metrópoles e a prática da fotografia por amadores até um sensível conto de Roniwalter Jatobá e crônica da engenheira agrônoma Denise Marçon.
     Outra atitude que merece aplauso reafirma a atenção da entidade para as carências dos vários segmentos da sociedade. Recentemente, conheci o Projeto Versos e Provas (com v), destinado a estudantes do Ensino Médio que se preparam para o vestibular. Para ajudar essa turminha a conhecer autores e assimilar obras incluídas na lista de leituras obrigatórias para o exame, docentes e atores promovem palestras e dramatizações, despertando na platéia o gosto pelo universo literário. No encontro que assisti, a professora Susana Ventura falou sobre Guimarães Rosa e o grupo Teatro d'Adversydade interpretou contos do escritor, entre eles, o emblemático A terceira margem do rio, seguindo-se sessão de perguntas pelos futuros vestibulandos.
     Mas outras coisas me encantam, naquele ambiente arejado e dinâmico. Pela primeira vez, desde a inauguração em novembro de 1986, a sede santista passa por uma reforma geral e, por isso, alguns setores ocupam outros locais, provisoriamente. Entre eles, a lanchonete, transferida para o saguão do teatro. O cardápio, orientado por nutricionista, manteve a variedade e o sabor, mas pode ser degustado em mobiliário e louças de extremo bom gosto, que combinam com o requinte daquele espaço. Quando recebi meu pedido, já estava semi-satisfeita com o silêncio preservado pelo piso acarpetado, a iluminação discreta e eficiente, a vista dos jardins e do trânsito passando lá fora, apreciados através das grandes paredes de vidro. E tudo ficou ainda melhor, ao abrir o guardanapo de papel, que poderia ser mais um, mas trazia impresso um verso de Chacal, em letra manuscrita: “com quantas bocas se faz um beijo?”. Só mesmo no Sesc!